Desculpe se pareci interessada
Desculpe se pareci interessada, não estou.
Chego no bar com a gargalhada na ponta da língua, faz tempo
que deixei o passado lá atrás. Os rostos conhecidos já estão ali, envolta de
uma mesa, que tem no centro as bebidas. Cumprimento, sento, encho o copo. A
conversa rola solta, e, por sorte, a risada também.
Em bar ninguém dança, mas bem que eu queria. Olho ao redor e
os paro em um cara, a barba cheia chama atenção, ele percebe, viro o rosto.
Discutimos sobre política e ouço com atenção a opinião de minha amiga semi-bêbada, semi-sóbria. Mudamos o
tópico, viagens. Precisamos fazer uma. Namoros, entre os rostos conhecidos
apenas eu e a tal que já bebeu o bastante estamos sozinhas. Fico feliz por ser
ela a me acompanhar, a que está bebendo sem ligar se alguém vai gostar, ou aprovar.
Olho ao redor outra vez, meus olhos procuram por algo que
não sei o que é. Vou até o bar, um drink, Sex
on the beach, peço ao garçom e ele ri. Rio junto, porque hoje a risada
escapa-me dos lábios como vento. Espero. “Sozinha?” ouço a pergunta,
confirmando com a cabeça. “Posso pagar uma bebida?” Olho para o tal.
Aquele, o cara da barba. “Já paguei.” “Posso reembolsar?” rio da piada ruim. Ele diz seu nome, digo o meu. Idade. Se estuda. Aonde trabalha. Do que gosta. Músicas. Passatempos. A mesma conversa de sempre, o diferente era só a barba mesmo. Respondo educada, ele continua. Não combinamos em nada, gosto disso, ele daquilo, odeio isso, ele ama. Desprezo, ele aprecia.
Aquele, o cara da barba. “Já paguei.” “Posso reembolsar?” rio da piada ruim. Ele diz seu nome, digo o meu. Idade. Se estuda. Aonde trabalha. Do que gosta. Músicas. Passatempos. A mesma conversa de sempre, o diferente era só a barba mesmo. Respondo educada, ele continua. Não combinamos em nada, gosto disso, ele daquilo, odeio isso, ele ama. Desprezo, ele aprecia.
Faço menção de voltar a mesa, ele me segura. “A conversa
está tão boa!”, rio comigo, ah, não está,
não. “Tudo bem, mudamos de assunto.” sugere, eu concordo, mudamos. Começa a melhorar, agora
o riso sai fácil, e posso concordar com algumas coisas. Falar sobre algo é
muito mais interessante do que falar sobre nós. Nós, como se existisse um nós. E como se eu pudesse ver um pronome
pessoal reto, na primeira pessoa do plural, como um simples pronome. Eu e minha
mania de classificar as coisas.
Enfim, falar sobre a gente, eu e ele, como indivíduos
diferentes. Mais fácil falar de política, invasão alienígena, impeachment, a fome no
mundo ou o preconceito. É fácil falar sobre tudo, menos o tudo que nos incluir. A conversa está boa, mas meus amigos estão
me esperando, e é para lá que devo ir. Fiz um novo amigo, bom. Muito bom.
Digo que preciso voltar para lá, para a minha zona de conforto “Não quer sentar conosco? Meus amigos
estão logo ali.” “Não, obrigada, elas estão a minha espera.” Telefone. Ele me
pede um telefone. Dito qualquer número aleatório, tanto faz. Não quero que ligue, ele nem iria ligar.
Volto para a mesa, com minha insegurança calçada nos pés,
conduzindo-me a voltar àquilo. Porque era aquilo que eu conhecia, e precisava
de segurança. Suspiro e consigo dizer ao meu eu decepcionado: Desculpe se pareci interessada, não estava.
— Bruna Elisabete Faé Barp
Foto: We heart it
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